*Contém Spoiler sobre o
filme.
Quando me apresentaram o
filme “As Pontes de Madison”, me disseram que era uma das maiores histórias de
amor já vistas no cinema. Assisti e fiquei com a sensação que aquilo não era
bem amor e sim uma ilusão.
O filme é sobre uma dona
de casa que vive em função da família: marido e filhos, lá em uma cidade do
interior dos Estados Unidos. Um dia o marido viaja com os filhos e a dona de
casa conhece um fotógrafo que estava de passagem e vivem quatro dias de paixão.
Aqui é importante ressaltar que são quatro dias de PAIXÃO (não amor como vende
o filme). Depois de anos os filhos dessa dona de casa encontram cartas dela contando
sobre este relacionamento com o fotógrafo que os fazem questionar os próprios
casamentos.
Essa história não é sobre
amor e sim sobre paixão, sabe por que? Porque é fácil gostar de alguém que
você mal conhece, quando você se apaixona, você enxerga a pessoa do jeito que quer enxergar, ela é a pessoa mais interessante do mundo, a mais sexy, o
jeito que ela mexe no cabelo é único, ela te faz se sentir feliz, único e
especial. É só ela chegar perto que você sente seu coração acelerar e ele se
aquece, você quer ficar abraçado dias e dias sem soltar, você fica disposto e
corado, se sente mais bonito e mais corajoso, pronto para enfrentar o que vier.
Você se imagina envelhecendo ao lado da pessoa e faz mil promessas, e acredita
que aguentará tudo, mesmo quando a pessoa estiver roncando ao seu lado, o ronco
dela será uma bela sonata para os seus ouvidos. E logo que conhecemos uma pessoa
mostramos nosso melhor lado: serenidade, sorrisos, beleza, alegria, conversas
legais sobre a vida, sobre filmes, sobre livros. Não ficamos mal humorados, não
ficamos chatos, não falamos sobre as contas que temos que pagar, sobre quem vai
levar o filho para a escola, etc.
Quatro dias são poucos
dias pra você aprofundar um relacionamento, e por isso que tanto a dona de casa
quanto o fotógrafo ficaram com a sensação de que um era o amor da vida do
outro, porque viveram quatro dias de paixão, de ilusão, de relação superficial,
sem um conhecer o outro verdadeiramente e como o relacionamento não foi para
frente por motivos de força maior, eles ficaram com a sensação de que foi O
relacionamento. Será que se eles tivessem se conhecido antes dela ser casada e
ter filhos (e por isso que ela optou em não ficar com ele) e tivessem casado e
tido filhos, eles continuariam com essa sensação de que um era o amor da vida
do outro?
Estou lendo um livro
chamado “Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos” do Zygmunt
Bauman, que fala sobre a nossa geração que quer ser feliz a qualquer custo e de
forma rápida, adquirindo produtos para tentar satisfazer essa necessidade de
prazer imediato. Os relacionamentos se tornaram bens de consumo. Segundo
Bauman, amor líquido é um amor “até segundo aviso”, o amor a partir do padrão
dos bens de consumo: mantenha-os enquanto eles te trouxerem satisfação e os
substitua por outros que prometem ainda mais satisfação. O amor com um espectro
de eliminação imediata e, assim, também de ansiedade permanente, pairando acima
dele. Na sua forma “líquida”, o amor tenta substituir a qualidade por
quantidade — mas isso nunca pode ser feito, como seus praticantes mais cedo ou
mais tarde acabam percebendo. É bom lembrar que o amor não é um “objeto
encontrado”, mas um produto de um longo e muitas vezes difícil esforço e de boa
vontade.
Esses dias li um texto,
desses textos legais sobre a vida que sempre aparecem no site obvious ou no
Sobre a Vida, que falava que queremos viver romances como nos filmes, porém os
filmes românticos só mostram o início do relacionamento, geralmente um casal
que se conhece, tem uns problemas no percurso, ficamos torcendo para eles
ficarem juntos e quando eles finalmente ficam juntos o filme acaba. E o que
acontece com aquele casal apaixonado? Observem que os filmes que mostram casais
juntos por muito tempo são classificados como drama...
Um filme que gosto muito
é o “Antes da Meia Noite” que é o último da trilogia “Antes do Amanhecer” e “Antes do Pôr-do-Sol”
que mostra como estão Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy) depois de
casados. Esse sim é um filme sobre amor. (Spoiler) Porque mostra que apesar
deles terem se apaixonado e por terem se separado de forma antecipada, ficaram
com aquele gostinho de ‘quero mais’ e a sensação de que um era o amor da vida
do outro (no Antes do Amanhecer), e nos filmes seguintes eles se reencontram e
ficam juntos e formam uma família, e o último filme mostra o casal não tão
apaixonado quando se conheceram, porém finalmente se amando, ou seja, mesmo
conhecendo o pior lado do outro, ambos se esforçam para manter e transcender o
relacionamento.
Não acho que devemos
ficar em relacionamentos ruins, porém não podemos nos iludir que os relacionamentos
serão só flores, os momentos difíceis irão acontecer, depois de anos juntos, em
alguns dias você irá se apaixonar novamente pela pessoa que está com você, em
outros você a achará insuportável, em alguns dias você irá querer largar tudo,
em outros você terá a plena certeza de que vale a pena regar aquela plantinha
chamada “relacionamento”. E é por isso que odeio o filme “As pontes de Madison”
porque ele nos vende que o verdadeiro amor só acontece quando estamos
apaixonados e isso é uma mentira, o verdadeiro amor acontece na convivência, no
dia a dia, na superação dos obstáculos, nos pequenos sacrifícios pelo outro, no
amar sem esperar nada, no entender o parceiro mesmo quando ele está
insuportável, chato, melancólico, com medo ou surtado. As pessoas são assim: imperfeitas.
E o amor está em compreender estas imperfeições e amar a pessoa mesmo assim.
P.S. Algumas pessoas se irritaram comigo por eu ter falado que não gostei do filme "As Pontes de Madison". Gente essa é uma opinião PESSOAL. Não fiquem ofendidas. Gosto cada um tem o seu. Essa foi minha percepção sobre o filme, uma pessoa disse que eu não entendi o filme, que na verdade é uma história de abdicação e sacrifício. Concordo sim com isso, pois a dona de casa não largou sua família para ir atrás do fotógrafo, isso é um ato de amor à família. A única coisa que discordo é ela ter achado que aquela paixão que viveu em 4 dias era o amor da sua vida, esse é o meu ponto. Ela vivenciou ótimas sensações, se apaixonou, talvez se ela tivesse ficado com ele poderia dizer que realmente era o amor da vida dela, mas não dá pra saber...